No último post desta série vimos que, por volta dos anos 1920, Freud se viu diante de um baita problema teórico: de que valia continuar utilizando o termo “inconsciente” para nomear uma secção específica de nosso psiquismo se essa parcela da mente se parecia mais com um tremendo balaio de gato onde cabiam coisas tão heterogêneas porquê os impulsos reprimidos e as partes do ego que impediam que esses impulsos fossem reconhecidos pelo sujeito, ou seja, que provocavam resistência?
Não seria melhor passar a utilizar o termo “inconsciente” num sentido meramente descritivo, ou seja, somente para fazer referência à forma em que se encontra uma representação mental da qual não estamos conscientes no momento?
“Sim, seria”: essa foi a resposta de Freud. Já que o noção de inconsciente estava perdendo a especificidade que tinha no início da psicanálise, melhor seria abandoná-lo de vez.
Mas o que colocar em seu lugar? Se o noção de inconsciente porquê uma região psíquica já não fazia mais sentido, logo aquela primeira repartição da mente em consciente, pré-consciente e inconsciente também iria para o ralo, manifesto?
Perfeitamente. O problema agora passava a ser logo a elaboração de um novo padrão para simbolizar o psiquismo. Se a mente não poderia mais ser pensada porquê dividida em consciente, pré-consciente e inconsciente, porquê uma seria uma novidade estruturação, capaz de superar as limitações da primeira?
A aposta freudiana no noção de Id
Freud foi encontrar o princípio da resposta que daria a essa pergunta num noção tirado da obra do médico e psicanalista Georg Groddeck, acerca do qual já falei algumas vezes cá no site e cuja obra, aliás, foi meu objeto de estudo no mestrado em Saúde Coletiva.
Influenciado pela leitura de Nietzsche, Groddeck vinha utilizando naquela era a palavrinha alemã “Es” (cuja tradução para o latim seria “Id”) para fazer referência a uma espécie de força vital que condicionaria toda a nossa existência, desde a formação dos órgãos do corpo até os nossos mais sutis pensamentos. Nesse sentido, nenhuma de nossas escolhas seria autônoma, ou seja, resultado de nosso livre-arbítrio. Groddeck costumava proferir que em vez da frase “Eu vivo” deveríamos proferir “Sou vivido por isso”.
O que Groddeck queria, na verdade, era invocar a atenção para o vestuário de que nenhum de nós se encontra só do contexto em que vive e carrega em si as marcas de sua própria história. Em decorrência, todas as nossas escolhas são o resultado da nossa relação coma natureza (da qual somos somente uma modificação) muito porquê de nossa história. O noção de “Es” servia para Groddeck justamente para revelar o vestuário de que o que nós chamamos de que nós não somos donos do nosso próprio nariz na medida em que nos encontra na sujeição de fatores que estão para além de nós mesmos e acerca dos quais na maioria das vezes não temos consciência.
Ora, esse modo de entender a existência humana proposto por Groddeck era bastante semelhante à desenlace que Freud havia chegado desde que inventara a psicanálise e que sintetizou na famosa frase: “O eu não é senhor na própria lar.”. No momento em que Freud proferiu essa frase, o que ele tinha em mente era a força do inconsciente na formalidade da conduta humana. Mas se a teoria de “o inconsciente” já não fazia muito sentido, porquê continuar sustentando que o “eu não é senhor na própria lar”?
Tomando emprestado de Groddeck o noção de “Es”, ora! O termo parecia perfeito para nomear a região da mente que Freud até logo vinha chamando de inconsciente e, de quebra, não tinha os inconvenientes do termo inconsciente!
O vocábulo “Es” na língua alemã é um pronome impessoal. Por isso, as edições mais recentes da obra de Freud preferem transcrever o termo por “Isso” em vez de “Id”, justamente para valorizar esse paisagem semântico referente a alguma coisa indeterminado, incógnito, obscuro. Essa particularidade, aliás, foi uma das razões que levaram Freud a gostar do noção. Pareceu-lhe o termo ideal para contrapor ao ego, na medida em que colocaria em primeiro projecto a verdadeira oposição que interessa à psicanálise, a saber: a oposição entre o ego e a pulsão, essa penúria insaciável de viver que pode, paradoxalmente, colocar a vida em risco. É esse conflito que de vestuário esteve nas raízes da psicanálise e não o embate entre consciência e inconsciente!
O Id freudiano
Diferentemente de Groddeck, que entendia o Id porquê a sentença da nossa vinculação indissociável com o mundo, Freud privilegiou o significado do noção referente a alguma coisa exterior ao ego, exemplificado na famosa frase de uma personagem da Escolinha do Professor Raimundo: “Ele só pensa naquilo”. Esse “naquilo” é obviamente a sexualidade, a qual, para Freud, se manifesta no ser humano de modo excessivo, desproporcionado e que, por conta disso, adquire uma conotação de exterioridade em relação ao ego. É por isso que, do ponto de vista freudiano, haverá sempre um conflito entre o ego e as pulsões no cerne de cada psique humana.
O Id é justamente o noção que Freud empregará para situar o lugar que essas pulsões ocupam no aparelho psíquico. No Id se encontrariam tanto as pulsões sexuais quanto as pulsões de morte (responsáveis pela agressividade que dirigimos contra nós mesmos e contra os outros). As pulsões seriam os representantes no psiquismo de necessidades provenientes do corpo e buscariam unicamente a satisfação sem levar em conta as possibilidades reais de obtê-la e, muito menos, se essa satisfação faria muito para o sujeito. A norma que regula o funcionamento mental dentro do Id é o princípio do prazer, ou seja, no Id uma representação mental se liga a outra não em função de uma relação lógica ou semiologia, mas sim devido ao vestuário de ambas estarem ligadas mutuamente a uma experiência de satisfação ou de procura dela. Assim, no Id, a fórmula 1 + 1 não é necessariamente igual a 2. Pode ser igual a 3 ou a 20 caso essa estranha equação favoreça a conquista do prazer e da satisfação. Em outras palavras, não há razão no interno do Id. A racionalidade é um modo de funcionamento mental a ser conquistado pelo sujeito.
No próximo post veremos porquê essa conquista é levada a cabo. Conheceremos de que modo o Id dá origem ao ego, esse rebento mal-agradecido que desde o promanação já entrará em conflito com seu pai e, se verosímil, veremos ainda o surgimento do terceiro e último elemento da segunda tópica, o famoso e feroz “superego”.
CONTINUA.
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